quarta-feira, 6 de junho de 2012

Procura-se um amigo.

Vinicius de Moraes

Procura-se um amigo

Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimentos, basta
ter coração. Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir. Tem
que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do
canto, dos ventos e das canções da brisa. Deve ter amor, um grande
amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor.. Deve
amar o próximo e respeitar a dor que os passantes levam consigo. Deve
guardar segredo sem se sacrificar.

Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja
de segunda mão. Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são
enganados. Não é preciso que seja puro, nem que seja todo impuro, mas
não deve ser vulgar. Deve ter um ideal e medo de perdê-lo e, no caso
de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa. Tem que
ter ressonâncias humanas, seu principal objetivo deve ser o de amigo.
Deve sentir pena das pessoa tristes e compreender o imenso vazio dos
solitários. Deve gostar de crianças e lastimar as que não puderam
nascer.

Procura-se um amigo para gostar dos mesmos gostos, que se comova,
quando chamado de amigo. Que saiba conversar de coisas simples, de
orvalhos, de grandes chuvas e das recordações de infância. Precisa-se
de um amigo para não se enlouquecer, para contar o que se viu de belo
e triste durante o dia, dos anseios e das realizações, dos sonhos e da
realidade. Deve gostar de ruas desertas, de poças de água e de
caminhos molhados, de beira de estrada, de mato depois da chuva, de se
deitar no capim.

Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a
vida é bela, mas porque já se tem um amigo. Precisa-se de um amigo
para se parar de chorar. Para não se viver debruçado no passado em
busca de memórias perdidas. Que nos bata nos ombros sorrindo ou
chorando, mas que nos chame de amigo, para ter-se a consciência de que
ainda se vive.

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